O que é a LGPD?
A LGPD foi
criada para prever e regulamentar questões relacionadas ao tratamento de dados
pessoais nos meios digitais, inclusive por pessoas físicas ou jurídicas,
privadas ou públicas. A sua aplicação se dá em todos os setores da economia e
do Direito, sendo aplicável sempre que houver algum tipo de coleta de dados de
terceiros, como ocorre, por exemplo, nas relações trabalhistas e consumeristas.
Qual a
finalidade de criação da LGPD?
A LGPD surge
com a finalidade de proteger as liberdades e direitos fundamentais, trazer
segurança jurídica aos atores envolvidos no mundo da coleta, armazenamento e
uso de dados (digitais ou não), e para estabelecer regras de proteção de dados
e critérios no tratamento desses dados pessoais.
Quais os
fundamentos da LGPD?
I — O
respeito à privacidade;
II — A autodeterminação
informativa; (que nada mais é do que a ideia de que o indivíduo
titular de dados pessoais deve ter controle, ou ao menos plena transparência,
sobre a destinação dada às suas informações pessoais, bem como das metodologias
utilizadas para tanto.)
III — A
liberdade de expressão, de informação, de comunicação e de opinião;
IV -— A
inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem;
V — O
desenvolvimento econômico e tecnológico e a inovação;
VI — A livre
iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor;
VII — Os
direitos humanos, o livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade e o
exercício da cidadania pelas pessoas naturais.
Quais os
princípios da LGPD?
O artigo 6º
da lei aduz que, além da boa-fé, são princípios da LGPD:
I —
Finalidade: realização do tratamento para propósitos legítimos, específicos,
explícitos e informados ao titular, sem possibilidade de tratamento posterior
de forma incompatível com essas finalidades;
II —
Adequação: compatibilidade do tratamento com as finalidades informadas ao
titular, de acordo com o contexto do tratamento;
III —
Necessidade: limitação do tratamento ao mínimo necessário para a realização de
suas finalidades, com abrangência dos dados pertinentes, proporcionais e não
excessivos em relação às finalidades do tratamento de dados;
IV — Livre
acesso: garantia, aos titulares, de consulta facilitada e gratuita sobre a
forma e a duração do tratamento, bem como sobre a integralidade de seus dados
pessoais;
V —
Qualidade de dados: garantia, aos titulares, de exatidão, clareza, relevância e
atualização dos dados, de acordo com a necessidade e para o cumprimento da
finalidade de seu tratamento;
VI —
Transparência: garantia, aos titulares, de informações claras, precisas e
facilmente acessíveis sobre a realização do tratamento e os respectivos agentes
de tratamento, observados os segredos comercial e industrial;
VII
— Segurança: utilização de medidas técnicas e administrativas aptas a
proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais
ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou difusão;
VIII —
Prevenção: adoção de medidas para prevenir a ocorrência de danos em virtude do
tratamento de dados pessoais;
IX — Não
discriminação: impossibilidade de realização do tratamento para fins
discriminatórios ilícitos ou abusivos;
X —
Responsabilização e prestação de contas: demonstração, pelo agente, da adoção
de medidas eficazes e capazes de comprovar a observância e o cumprimento das
normas de proteção de dados pessoais e, inclusive, da eficácia dessas medidas.
A quem se
aplica a LGPD?
A LGPD se
aplica a toda pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado,
visando garantir a proteção dos direitos fundamentais de privacidade, liberdade
e livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural, e necessariamente
precisa ser observada pela União, Estados, Distrito Federal e municípios, em
relação às normas gerais.
A LGPD não se
aplica ao tratamento de dados pessoais realizado por pessoa natural para fins
exclusivamente particulares e não econômicos; realizado para fins —
exclusivamente — jornalísticos, artísticos ou acadêmicos.
A LGPD ainda
não se aplica para fins exclusivos de: Segurança Pública; Defesa Nacional
e segurança do Estado ou atividades de investigação e repressão de infrações
penais; ou provenientes de fora do território nacional e que não sejam objeto de
comunicação, uso compartilhado de dados com agentes de tratamento brasileiros
ou transferência internacional de dados com outro país que não o de
proveniência, desde que o país de proveniência proporcione grau de proteção de
dados pessoais adequado ao previsto.
LGPD
— Operador, controlador e encarregado
O
controlador é "toda pessoa natural ou jurídica, de direito público ou
privado, a quem competem as decisões referentes ao tratamento de dados pessoais"
(artigo 5º, VI).
O operador é
a "pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, que
realiza o tratamento de dados pessoais em nome do controlador" (artigo 5º
VII).
Já o
encarregado é "pessoa indicada pelo controlador para atuar como canal
de comunicação entre o controlador, os titulares dos dados e a Autoridade
Nacional de Proteção de Dados". Equipara-se à figura do DPO (Data
Protection Officer — Oficial de Proteção de Dados, em português), e
tem como responsabilidade legal estabelecer comunicação com os titulares e
autoridade nacional, esclarecimentos, providências, orientações internas.
O
controlador e o operador de dados são agentes responsáveis pelo tratamento das
informações. O controlador está no topo da cadeia de tratamento de dados e
a diferença entre eles está justamente no poder de decisão.
O operador
pode realizar o tratamento de dados, mas isso ocorre a partir das ordens de um
controlador. Essa responsabilidade do controlador pode ser percebida da análise
do texto da LGPD. Na lei, a palavra "controlador" aparece 62 vezes,
enquanto a palavra "operador" aparece 11 vezes, e isso está
diretamente relacionado à diferença de responsabilidades de ambos — e até mesmo
de um sobre o outro.
O que é o
tratamento de dados previsto na LGPD?
O tratamento
de dados na LGPD é previsto por 20 verbos de ação. Diz a lei que o "tratamento
de dados é toda operação realizada com dados pessoais, como as que se referem a
coleta, produção, recepção, classificação, utilização, acesso, reprodução,
transmissão, distribuição, processamento, arquivamento, armazenamento,
eliminação, avaliação ou controle da informação, modificação, comunicação,
transferência, difusão ou extração".
Esse rol não
é taxativo, até mesmo porque precisamos considerar que a evolução tecnológica
está em franca expansão e novas ações (verbos) podem surgir para definir
posturas ou comportamentos ligados à finalidade a que se destina a LGPD.
O que são
dados pessoais sensíveis?
Os dados
"sensíveis" são os que revelam origem racial ou étnica, convicções
religiosas ou filosóficas, opiniões políticas, filiação sindical, questões
genéticas, biométricas e sobre a saúde ou a vida sexual de uma pessoa, e que
têm alto poder de causar discriminação.
Devido ao
seu teor e às consequências negativas que seu vazamento pode causar ao titular,
inclusive gerando direito a reparação moral tanto na esfera trabalhista quanto
cível, a lei tratou de defini-los como "sensíveis" e prever
tratamento especial.
LGPD nas
relações de trabalho
Fase
pré-contratual — a fase pré-contratual é a fase do primeiro
contato do empregado com o empregador e geralmente é realizada por terceiros
(recrutador, departamento pessoal, empresas especializadas etc.).
Nessa fase
há a disponibilização da vaga, análise do currículo, entrevistas,
dinâmicas e posterior escolha do candidato selecionado.
Nessa fase
é proibida a coleta de dados que possam gerar qualquer
critério discriminatório entre os candidatos, como, por exemplo, solicitação de
exames de gravidez, toxicológico, exames de sangue, atestado de antecedentes
criminais e análise de crédito (débito).
Essa é a
regra. Contudo, há exceções previstas em lei, como é o caso do exame
toxicológico para o motorista profissional (artigo 168, § 6°, da
CLT) e do atestado de antecedentes criminais que é obrigatório para
quem trabalha como vigilante (artigos 12 e 16, VI, da Lei n. 7.102/1983 c/c art. 4°, I
da Lei n. 10.826/2003).
Por outro
lado, o exame de gravidez e a análise de crédito (débito) — mesmo para trabalho
em instituições financeiras — são proibidos (artigo 1° da Lei n. 9.029/1995), sendo o segundo,
inclusive, com base nos termos do Acórdão do TST prolatado nos autos do
Processo n. 1109-68.2012.5.10.0020.
A empresa
precisará informar claramente aos candidatos não selecionados a política de
utilização dos dados que foram fornecidos e, principalmente, o que será feito
com os dados e documentos daqueles que não foram selecionados.
Fase
contratual — é na fase contratual que o empregado
terá conhecimento da política de tratamento de dados da empresa e dará o seu
consentimento (ou não) expresso quanto ao seu teor.
Fase
pós-contratual — quando da ocorrência de eventual desligamento do
funcionário da empresa, seja por qual motivo for, também é necessária a
observância dos preceitos da LGPD.
Isso se dá
pelo fato de que a LGPD, expressamente, aduz que é necessária a informação de
finalização do uso de dados, seja por determinação legal, seja por solicitação
do titular do direito.
Ocorre que,
quando falamos de relações trabalhistas, há obrigações de guarda de documentos
que decorrem de imposição legal, e isso afasta a solicitação particular do
titular do direito.
São
situações que precisarão de análise caso a caso, como, por exemplo, o dever de
guarda para fins de documentação probatória para ações trabalhistas. Como
sabido, o prazo decadencial para propositura de ação trabalhista é de dois anos
contados da data do desligamento (considerando a projeção do aviso prévio).
Portanto, a empresa possui garantia legal para guardar documentos
comprobatórios dentro do prazo prescricional do direito de ação do titular do
direito.
LGPD na fase
contratual
Como visto,
o consentimento do funcionário deve ser expresso e as cláusulas que versarem
sobre a política de tratamento de dados da empresa devem vir destacadas no
documento, de forma a garantir a observância dos princípios da finalidade,
transparência e segurança.
Há casos
específicos em que a LGPD se aplicará na fase contratual, vejamos:
- Ficha de registro: na ficha de
registro é comum que contenha dados pessoais e dados sensíveis,
a exemplo da filiação a sindicato. Nesse aspecto a LGPD prevê
expressamente a necessidade de tratamento desses dados com a limitação de
acesso à ficha de registro do funcionário.
- Formalização de contratos e aditivos:
destacam-se os contratos e aditivos, principalmente para quem já possuía o
vínculo de emprego antes da entrada em vigor da LGPD.
Para esses casos, será necessária a adequação do contrato de trabalho à
LGPD.
- Realização de exames: a realização de exames
periódicos encontra respaldo na legislação vigente. Assim, todos os
funcionários celetistas são obrigados a realizar o exame médico periódico.
Tais exames abrangem a avaliação clínica e envolvem anamnese ocupacional e
exames físico e mental, sendo possível haver exames complementares de
acordo com os termos específicos da NR-7. Contudo, não podem ser
solicitados exames que possam expor a saúde do trabalhador a fim de
causar-lhe discriminação, a exemplo dos exames de HIV, gravidez, câncer
etc.
- Recebimento de atestados: embora não seja
obrigatório o preenchimento da CID (Classificação Internacional de
Doenças e Problemas Relacionados à Saúde) no atestado médico, caso haja
identificação da doença e/ou o motivo do afastamento, pela LGPD, tais
dados passam a ser dados sensíveis e, portanto, precisarão de política
específica de guarda e acesso.
- Compartilhamento de dados com seguradoras,
planos de saúde, entidades sindicais: pela LGPD o compartilhamento desses
dados precisará de autorização expressa do titular, principalmente quando
se tratar de dados de familiares e de terceiros. A exceção virá quando
essas informações decorrerem de pedido judicial, de texto de lei ou para
fins de dados de estatística do governo.
Algumas
questões práticas do ambiente de trabalho
- Dados biométricos: a LGPD classifica os dados
biométricos como dados pessoais sensíveis. Os dados biométricos e
genéticos são tratados pela LGPD como dados pessoais sensíveis pois
podem ser utilizados para classificar grupos de indivíduos ou
reconhecê-los individualmente. O reconhecimento biométrico facial é
capaz de permitir a classificação do indivíduo em gênero ou etnia.
- Menor aprendiz: a formalização da contratação
do menor aprendiz passará por mudança significativa. Isso acontecerá
porque o §1º do artigo 14 diz que o "tratamento de dados
pessoais de crianças deverá ser realizado com o consentimento específico,
em que destaque, dado por pelo menos um dos pais ou responsável legal".
Essa mudança se dá pois a lei só previa a assistência do menor no
momento da rescisão e, com a LGPD, a assistência deverá ser outorgada
também na contratação.
- Vigilância de empregados (e-mails, redes
sociais, dispositivos funcionais, dispositivos pessoais, geolocalização):
a LGPD não proíbe o acesso a e-mails ou dispositivos funcionais. Contudo,
a informação deverá ser clara, dispondo do propósito e finalidade da
coleta, assim como deverá ter a ciência do funcionário quanto aos limites do
acesso da empresa aos seus dados pessoais e o tratamento que será dado a
esses dados.
- Monitoramento interno e externo do ambiente da
empresa: a LGPD não proíbe o monitoramento interno e externo do
funcionário, mas tal monitoramento deverá ser justificado e com o
consentimento do funcionário, zelando pela transparência, finalidade e
necessidade.
- Compartilhamento de dados pessoais de
empregados entre grupo econômico e terceiros: caso o controlador
precise comunicar ou compartilhar dados pessoais com terceiros, deve obter
consentimento expresso do titular para esse fim, exceto em situações já
previstas em lei que dispensam tal autorização. Tal previsão legal
está no §5º do artigo 7º da LGPD e revela a necessidade de que as
empresas sejam mais cautelosas ao compartilhar e receber dados de
clientes como decorrência de serviços prestados a outras empresas, uma vez
que sempre deverá haver uma expressa e específica autorização do titular
dos dados para que haja o compartilhamento dessas informações.
- Teletrabalho e proteção de dados: sem dúvidas
a finalidade precípua da LGPD é a proteção de dados do titular face
àqueles que coletam esses dados. Quando tratamos de
"teletrabalho", o principal elemento para traçar as diretrizes
da atuação da empresa no ambiente de trabalho do seu funcionário
(residencial ou não) se dará pelo contrato de trabalho e as previsões
acerca da aquisição, manutenção e fornecimento de equipamentos
tecnológicos e da infraestrutura necessária para a prestação do trabalho.
Tais medidas equiparam-se ao caso do uso de computador ou e-mail
institucional no qual é permitido o acesso pelo empregador com o conhecimento do
funcionário. Já em caso de uso de equipamentos pessoais, tal
acesso não atende à finalidade da LGDP, em atenção aos princípios nela
previstos, além do próprio artigo 5º da CF/88, que garante a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e
à propriedade.
Término do
tratamento de dados
O
artigo 15 da LGPD prevê que o término do tratamento de dados pessoais
ocorrerá nas seguintes hipóteses:
I -
Verificação de que a finalidade foi alcançada ou de que os dados deixaram de ser
necessários ou pertinentes ao alcance da finalidade específica almejada;
(controlador)
II - Fim do
período de tratamento; (controlador ou lei, regimento)
III -
Comunicação do titular, inclusive no exercício de seu direito de revogação do
consentimento conforme disposto no § 5º do artigo 8º desta lei,
resguardado o interesse público; (titular)
IV -
determinação da autoridade nacional, quando houver violação ao disposto nesta
lei.
Sanções e
penalidades previstas na LGPD
A autoridade
responsável pela fiscalização da LGPD será a ANPD - Autoridade Nacional de
Proteção de Dados. Contudo, a fiscalização não está adstrita à ANPD e poderá
ser exercida por outras entidades fiscalizadoras, como os órgãos de proteção ao
trabalhador (MPT, MPF, Auditor Fiscal etc.).
Estão entre
as sanções administrativas para a prática de infrações à LGPD a aplicação de
advertências, de multas simples ou diárias que podem chegar à quantia
expressiva de R$ 50 milhões, e ainda publicização da infração e bloqueio e
eliminação dos dados pessoais.
Considerações
finais
Como
elencado nos próprios fundamentos da LGPD, esta tem como escopo a garantia das
liberdades e direitos fundamentais da pessoa humana (já previstos no artigo 5º
da CF/88), bem como o uso de dados pessoais (sensíveis ou não) com o
propósito de trazer segurança jurídica tanto para quem fornece os dados
(titular) quanto para aqueles que captam esses dados (controlador/operador).
A adequação
à LGPD é de extrema urgência, posto que as relações de coleta e armazenamento
de dados são praticamente diárias e estão, a partir de então, sujeitas às
regulamentações previstas na LGPD.
Dentro do
cenário das relações trabalhistas, como vimos, as mudanças também adquirem
contornos específicos, principalmente durante a vigência do contrato de trabalho,
com atenção especial aos contratos já vigentes antes da promulgação da LGPD.
A adequação
à LGPD passará pela existência de boas práticas, treinamentos, normas internas
e revisão de contratos e manuais a fim de garantir que os controladores busquem
se adequar à lei visando minimizar ou mesmo eliminar os riscos de não
observância aos preceitos da Lei Geral de Proteção de Dados.
Fonte:
Conjur.
https://www.conjur.com.br/2020-set-17/lgpd-impactos-trabalhistas
Comentários
Postar um comentário